“Todas as manhãs ela deixa os sonhos na cama, acorda e põe sua roupa de viver.”
Por Viviane França(*)
Na última semana o Presidente Lula sancionou a lei 14.611/23 conhecida como a lei da igualdade salarial entre mulheres e homens, que trouxe alterações importantes a CLT.
Diferentes dispositivos legais abordam a questão da igualdade de gênero, além das convenções internacionais. No Brasil, a Constituição de 1988 já prevê a equiparação salarial entre mulheres e homens. A CLT de 1943 já trazia dispositivos de proteção ao trabalho da mulher, sendo que no ano de 1999, a CLT sofreu uma alteração importante que proibiu que vagas de trabalho fossem anunciadas com referência ao sexo ou, que trouxessem o sexo como determinante para fins remuneratórios.
Ocorre que, comprovadamente a realidade brasileira é outra. Diferente da administração pública que tem instrumentos consolidados de equiparação salarial para mulheres e homens como o concurso público (com algumas ressalvas), igualdade salarial entre cargos em comissão de gestão ou de assessoramento independente do sexo, portal da transparência, nas empresas privadas a realidade é muito diferente. Os índices apontam que, além das mulheres ganharem menos que os homens no exercício de funções idênticas, estão em condições de trabalho muito desiguais.
Segundo pesquisa do PNAD de 2019, a renda recebida por mulheres representa em média 77,7% do rendimento recebido por homens. Entre as categorias ocupacionais, a menor diferença está nos cargos de direção, onde os salários das mulheres correspondem a 61,9% do salário dos homens, e estes são os menos ocupados por nós. Entre profissionais das ciências, intelectuais, os nossos salários correspondem a 63,6% do salário deles.
Neste sentido a lei 14.611 traz alterações importantes. O que acrescenta?
A nova lei altera a CLT nas medidas de fiscalização, transparência e promoção da igualdade entre mulheres e homens.
Fiscalização: será intensificada nas empresas além da previsão de criação de canais exclusivos de denuncia a respeito da discriminação salarial entre mulheres e homens. As multas para o descumprimento da lei estão mais rígidas a título de valores, além da possibilidade expressa da indenização moral para a mulher prejudicada.
Transparência: as empresas devem estabelecer mecanismos que permitam a transparência salarial permitindo assim que as próprias trabalhadoras fiscalizem os salários recebidos pelos homens no exercício da mesma função. As empresas com mais de 100 empregados passam a ser obrigadas a fornecer relatórios salariais por semestres que apontarão também, a proporção de cargos de direção ocupados por mulheres e homens.
Na promoção a igualdade: as empresas passam a ser obrigadas a implementar programas de promoção da igualdade entre mulheres e homens, e medidas que promovam a capacitação das mulheres.
Avançamos mais nas regras jurídicas, indo ao encontro dos objetivos da Agenda 2030 da ONU que prevê entre as metas a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres. Ocorre que, a situação real aponta para o principal hoje: o cumprimento real das leis que altera a situação das mulheres no mercado de trabalho.
Somos organizadas, competentes, humanas e antes de tudo somos, a todo tempo, as protagonistas da nossa história e das mudanças históricas que são parte das lutas diárias que travamos numa sociedade machista e patriarcal. Portanto falar, denunciar, não se calar será mais uma vez um dos principais instrumentos de eficácia dessa nova lei para o início de uma mudança real no mercado e nas condições de trabalho de todas nós.
(*) Mulher, Advogada, Pesquisadora, Mestre em Direito Público, Especialista em Ciências Penais, autora do livro Democracia Participativa e Planejamento Estatal: o exemplo do plano plurianual no município de Contagem. Secretária de Defesa Social de Contagem/MG, Sócia do França e Grossi Advogados.