Por Viviane França(*)
Recentemente participei da Conferência Internacional de Mulheres Graciosas, um encontro de mulheres cristãs, organizado pela Pastora Consuello, uma liderança evangélica de Contagem. O da minha fala, que contou com a colaboração da Patrulha da Mulher da Guarda Civil e do Consórcio Mulheres das Gerais, foi a importância da informação para superar ciclo de violência doméstica. No entanto, a participação nesse encontro me levou a uma reflexão mais abrangente sobre o papel que as organizações e lideranças evangélicas podem desempenhar na efetivação das políticas públicas nos territórios. É essa reflexão que compartilho hoje com vocês.
O Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023 mostrou que no último ano todas as modalidades de violência contra as mulheres cresceram no Brasil. De acordo com o portal naosecale.ms. gov.br, do Governo do Mato Grosso do Sul, 40% das denúncias de violência doméstica realizadas em órgãos especializados são realizadas por mulheres evangélicas. Apesar de o Brasil ter uma das leis de combate à violência doméstica mais modernas do mundo, o acesso das mulheres a informação e a rede de proteção ainda é precário, o que vem desafiando diariamente o Estado à construção ou reformulação de políticas públicas mais eficazes no enfrentamento a violência contra as mulheres.
O CENSO do IBGE 2010 já apontava um crescimento das pessoas que se declaravam evangélicas no Brasil (de 5,2% em 1970 para 22,2%). Em 2023, pesquisa do Centro de Estudos da Metrópole da USP aponta que 17 novos templos evangélicos foram abertos por dia apenas no ano de 2019 no Brasil. Segundo pesquisa do instituto Datafolha de julho de 2024 a maioria de membros das Igrejas Evangélicas em São Paulo são mulheres negras com renda de até três salários mínimos; 71% dos entrevistados frequentam templos de pequeno porte com até 200 membros, característicos em regiões de periferia. Uma em cada quatro pessoas é evangélica na maior cidade do Brasil, que tem 58% da população de mulheres. Segundo a jornalista Anna Ballousser, autora do livro O Púlpito – (2024) “em questão de anos, teremos mais evangélicos do que católicos no Brasil. Se os prognósticos demográficos se confirmarem, será um conjunto com maioria de mulheres negras e pobres”.
Cumpre destacar, no entanto, para o intento desta reflexão, que mais do que considerar a comunidade evangélica em termos de quantidade no Brasil, é atentar para o protagonismo social e político que assumem. As igrejas evangélicas estão presentes nos rincões, no Brasil profundo, mas, sobretudo, nas periferias das grandes cidades. Chegam primeiro e onde o estado não chega, com a coordenação de projetos sociais que atendem de forma irrestrita e acolhedora as pessoas em vulnerabilidade, estabelecendo uma relação de apoio e confiança com membros ou não.
Os dados acima são uma pequena amostra da capilaridade das igrejas e lideranças evangélicas nos territórios e que essas podem e devem se construir cada vez mais como interlocutoras sócias estratégicas para o poder público, principalmente para as prefeituras.
Termino reafirmando a importância do espaço aberto pela Pastora Consuello. Saí de lá com a certeza de que temos fortes aliadas e parceiras no combate a violência contra a mulher e em outras pautas da segurança pública em Contagem. No entanto, acredito que esse foi um acontecimento também aponta para a necessidade de o poder público se atentar para a importância de uma agenda mais abrangente com esse segmento que pode impulsionar ações e políticas públicas que incidem na vida das pessoas que mais precisam.
*VIVIANE FRANÇA é Mulher, Advogada, Pesquisadora, Mestre em Direito Público, Especialista em Ciências Penais, autora do livro Democracia Participativa e Planejamento Estatal: o exemplo do plano plurianual no município de Contagem. Secretária de Defesa Social de Contagem/MG, Sócia do França e Grossi Advogados.