Legado me levanto sobre o sacrifício de um milhão de mulheres que vieram antes e penso o que é que eu faço para tornar essa montanha mais alta para que as mulheres que vierem depois de mim possam ver além. Rupi Kaur
Por Viviane França(*)
Fernanda Torres alcançou um marco histórico ao se tornar a primeira brasileira a vencer o Globo de Ouro de Melhor Atriz, uma conquista que deveria ser celebrada por todos. No entanto, o que poderia ser um momento de exaltação de seu talento e dedicação, foi manchado por críticas superficiais e comentários depreciativos sobre sua aparência, vindos de um programa de TV argentino. Esse episódio, além de desviar a atenção do mérito de Fernanda, expõe um problema antigo e profundamente enraizado em nossa sociedade: a rivalidade entre mulheres.
Essa rivalidade não é um fenômeno novo. Ao longo de nossas vidas, somos ensinadas, direta ou indiretamente, a competir umas com as outras, seja na aparência, nas realizações profissionais ou até mesmo nas escolhas pessoais. Essa competição muitas vezes se manifesta em forma de críticas destrutivas, que minam a autoestima e o senso de comunidade entre mulheres. A sociedade patriarcal, com seus padrões irreais e expectativas opressivas, tem um papel crucial na manutenção dessa dinâmica. Ao nos impor modelos de sucesso e beleza inalcançáveis, nos coloca em uma posição de constante comparação e julgamento.
No cotidiano, essa rivalidade se reflete de diversas maneiras. Seja no ambiente de trabalho, onde mulheres se veem como competidoras em vez de colaboradoras, ou nas redes sociais, onde cada detalhe de nossas vidas é passível de análise e crítica, a rivalidade feminina se perpetua. Em vez de nos apoiarmos e celebrarmos as conquistas umas das outras, muitas vezes nos deixamos levar por sentimentos de inveja e julgamento. Cada comentário ácido, cada olhar de reprovação, alimenta um ciclo que nos distancia umas das outras.
No entanto, essa rivalidade não é inevitável. Ela é, em grande parte, resultado de uma construção social que pode e deve ser desconstruída. A mudança começa com a autoconsciência e a prática da empatia. Precisamos refletir sobre nossas próprias atitudes e questionar os impulsos que nos levam a julgar outras mulheres de forma severa. Quando enxergamos o sucesso de outra mulher como uma ameaça, perpetuamos a ideia de que há um espaço limitado para nós na sociedade. Mas essa percepção é equivocada. Há espaço para todas brilharem, e cada vitória individual é, na verdade, uma vitória coletiva.
A chave para superar essa rivalidade está na sororidade. A solidariedade entre mulheres é fundamental para construir um ambiente de apoio mútuo, onde todas possam prosperar. Ao celebrarmos as conquistas umas das outras, fortalecemos não apenas a quem é celebrada, mas também a nós mesmas. A prática da sororidade nos ensina que o sucesso de uma mulher não diminui o nosso, mas, ao contrário, abre caminhos para que todas possam alcançar seus objetivos.
Fernanda Torres, com sua vitória no Globo de Ouro, nos oferece uma oportunidade de reflexão. Sua conquista é um lembrete de que o talento e a dedicação devem ser celebrados, independentemente de qualquer outro fator. Precisamos transformar episódios de crítica e rivalidade em momentos de apoio e exaltação mútua. Somente assim poderemos construir uma sociedade mais justa e igualitária, onde as mulheres se sintam encorajadas a alcançar o máximo de seu potencial.
Em última análise, a verdadeira força feminina reside na união. Quando deixamos de lado a rivalidade e nos apoiamos, nos tornamos invencíveis. Ao invés de competir, devemos colaborar; ao invés de criticar, devemos celebrar. Assim, poderemos transformar o mundo em um lugar onde todas as mulheres tenham a oportunidade de brilhar, juntas e sem barreiras.
*VIVIANE FRANÇA é Mulher, Advogada, Pesquisadora, Mestre em Direito Público, Especialista em Ciências Penais, autora do livro Democracia Participativa e Planejamento Estatal: o exemplo do plano plurianual no município de Contagem. Secretária de Defesa Social de Contagem/MG, Sócia do França e Grossi Advogados.