Por Viviane França(*)
Suely Xavier tem 59 anos, é massoterapeuta e microempresária. Nasceu em Contagem, cidade que ainda reside. Sua vida é um testemunho de força, fé e resiliência. Mais do que uma profissional competente, ela é uma mulher que enfrentou e venceu as adversidades mais dolorosas. Sua trajetória é marcada por desafios que poderiam tê-la paralisado, mas tornaram-se motivos para recomeçar e se fortalecer.
Suely, você enfrentou situações difíceis em seus relacionamentos. Como isso impactou sua vida?
Me casei jovem, aos 17 anos. Com poucos meses de casamento descobri várias traições e já ocorriam várias formas de desrespeito com palavras e ameaças. Na época, estava tentando engravidar, pois, naquele tempo um filho fortaleceria a família e resolveria os problemas conjugais. Não demorou para as agressões físicas começarem, mesmo grávida, apanhava por qualquer motivo. Estava sendo ameaçada de morte, assim não tive alternativa a não ser me separar. Tinha uma filha bebê que dependia de mim. Pedi auxílio aos meus pais, que me acolheram em casa.
Um tempo depois, conheci outra pessoa, que inicialmente era maravilhosa, admirável. Decidimos morar juntos. Aos 23 anos engravidei desse novo companheiro, porém a história de violência se repetiu, dessa vez bem pior. Eu era literalmente espancada. Esse homem chegava a pular em cima da minha barriga nas sessões de tortura que realizava, fiquei nesse ciclo de violência por três anos. O medo de morrer me fez pedir ajuda novamente. A gota d’água foi em uma noite que eu apanhei a noite inteira, nesse dia eu pensei que não fosse sobreviver! Eu me sentia impotente, pois era o segundo relacionamento em que isso acontecia.
Eu tinha um grande sentimento de fracasso e de que a culpa dos insucessos era minha, a dor da agressão dói na alma, não só no corpo. Mesmo agindo de forma correta, respeitando o lar, trabalhando. Perdi as contas de quantas vezes cheguei para trabalhar em uma fábrica de Contagem, com o olho roxo e diversos hematomas pelo corpo… todo mundo via. Quando meu pai viu a gravidade da situação, me auxiliou a sair desse relacionamento. Graças a Deus, saí viva.
O que te ajudou a sair desse ciclo de violência?
Foi um processo. No início, eu não acreditava que conseguiria. O medo e o julgamento da sociedade me paralisavam. Mas, com o tempo, percebi que minha fé era maior do que o medo. Pedi forças a Deus e busquei apoio emocional e prático com minha família. Também precisei des-construir muitas crenças que me faziam pensar que eu não merecia mais do que aquilo. Quando entendi meu valor como mulher, decidi recomeçar minha vida.
Depois de superar a violência, você enfrentou outros desafios? Como lidou com eles?
A violência deixou marcas, e precisei de tempo para me reconstruir. Depois, enfrentei um afastamento do trabalho devido a uma lesão (LER), o que me levou a um quadro de depressão, pois o trabalho era extremamente essencial na minha vida, era meu refúgio… Foi mais um momento em que minha fé foi testada. Fiz tratamento pelo CAPS durante um período e com a ajuda de Deus e dos profissionais que me atenderam e durante aquele período consegui me libertar.
Encontrei na massoterapia uma nova oportunidade. Comecei a atender em casa, com duas clientes, e fui reconstruindo minha vida aos poucos, acreditando que era possível criar um futuro melhor.
Como essas experiências influenciam a maneira como você vive hoje?
Tudo o que vivi me fez mais forte e sensível às dores dos outros. Quando vejo uma mulher sofrendo violência, lembro do que passei e sei como é difícil sair dessa situação. Por isso, sempre tento incentivar outras mulheres a não desistirem. A violência não define quem somos. Somos muito mais do que isso.
Que mensagem você gostaria de deixar para outras mulheres que enfrentam situações semelhantes?
Não aceite ser refém de maus-tratos. É possível virar a chave, reescrever sua história e viver com dignidade. Eu sou prova disso. Acredite no seu valor, busque apoio e tenha fé. Com coragem e determinação, é possível superar qualquer adversidade.
Hoje, Suely Xavier celebra não apenas suas conquistas, mas a liberdade e a força que encontrou ao longo do caminho. Sua história é um lembrete poderoso de que é possível transformar dor em aprendizado, violência em resiliência e medo em força. Suely é a prova viva de que a superação é um caminho árduo, mas profundamente transformador.
*VIVIANE FRANÇA é Mulher, Advogada, Pesquisadora, Mestre em Direito Público, Especialista em Ciências Penais, autora do livro Democracia Participativa e Planejamento Estatal: o exemplo do plano plurianual no município de Contagem. Secretária de Defesa Social de Contagem/MG, Sócia do França e Grossi Advogados.