Festa da Abolição da Comunidade dos Arturos deste ano, que assinala os 130 anos do fim da escravatura _ Foto Ricardo Lima
A Lei Áurea, que extinguiu oficialmente a escravidão no Brasil, foi assinada em 13 de maio de 1888. A data integra o calendário da história do país e é considerada pelo movimento negro como um dia nacional de luta contra o racismo. Mas a Festa da Abolição da Comunidade dos Arturos deste ano, que assinala os 130 anos do fim da escravatura, começou ainda no sábado, dia 12 de maio, com a concentração das guardas de Congo e Moçambique da Comunidade dos Arturos. Após o agrupamento na capela da comunidade, as guardas seguiram em cortejo até a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Rosário e à Casa de Cultura Nair Mendes. Centenas de pessoas participaram da celebração.
A chegada da noite de sábado marcou o hasteamento das bandeiras e estandartes das guardas na capela da comunidade. Ao lado da cruz de cruzeiro, os marcos foram levantados. “Tirando maio, a única outra data em que há levantamento de marco ocorre em outubro”, explica Maria Auxiliadora da Luz, rainha 13 de maio.
Aos poucos, vão chegando na capela local reis e rainhas de diversas outras realezas, capitães, tocadores e dançantes devotos de Nossa Senhora do Rosário. Junto com eles, cores, ritmos e a fé em dias de mais igualdade entre as pessoas.
Cânticos e hinos pediram proteção, força e aconselhamento durante a concentração e também no cortejo até a Matriz de Nossa Senhora do Rosário, quando um grupo permaneceu no local e outro se dirigiu à Casa de Cultura. Embora tenha caráter festivo, a celebração é uma forma de resistir: a abolição da escravatura é ainda um projeto em construção, e isso precisa ser constantemente reafirmado.
José Bonifácio, o Bengala, mestre da guarda de Congo, lembra que, mais do que uma festa, o ensejo busca reafirmar tradições negras, rememorar as chagas da escravidão e denunciar o racismo estrutural que ainda persiste no Brasil. “Essa celebração é uma forma de rememorar o nosso sofrimento e de nossos antepassados e de reafirmar nossa trajetória, de onde viemos e onde estamos. Não éramos escravos, éramos reis e rainhas, mas fomos arrancados de nossas terras e escravizados. A abolição da escravidão no Brasil, que em 13 de maio deste ano completa 130 anos, é um projeto incompleto, pois a juventude negra é a que mais morre, as mães pretas são as que mais sofrem e o racismo é ainda uma realidade. Precisamos lembrar e denunciar esses absurdos”, defende o mestre.
O que é uma comunidade quilombola?
Durante cem anos após o fim da escravidão no Brasil, o termo quilombo foi usado para nomear locais com grandes concentrações negros que se rebelaram contra o regime colonial. Com a Constituição Federal de 1988, o termo “quilombo” teve seu conceito ampliado, sendo atualmente utilizado para designar áreas ocupadas por comunidades remanescentes dos antigos quilombos.
Arturos: resistência no coração da cidade
A Comunidade dos Arturos é um quilombola encravado no centro de Contagem no qual atualmente vivem cerca de 90 famílias. A comunidade foi certificada como remanescente de quilombo em 2003 e, em 2014, foi declarada Patrimônio Cultural Imaterial do município de Contagem e do estado de Minas Gerais. Os Arturos preservam tradições dos negros que foram trazidos da África para o Brasil, por meio de festas e celebrações, como a Festa de Libertação dos Escravos, em 13 de maio, e resistem à especulação imobiliária comum aos centros urbanos.