Coluna Mulher – 18.06.2023 – O machismo estrutural que afeta as mulheres
O machismo estrutural que afeta as mulheres
Por Viviane França(*)
“Mais amor não dos homens mas de nós mesmas e umas das outras.”
O Poema da Rupi Kaur, extraído do livro “O que o sol faz com as flores”, escrito pela autora no ano de 2017, reflete uma realidade estarrecedora também documentada por dados divulgados na última semana pela ONU: o machismo estrutural que afeta as mulheres, trazendo destaque para o quanto ainda precisamos avançar no tema igualdade de gênero – sobretudo entre nós mesmas.
A pesquisa, divulgada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), foi realizada em 80 países, sendo o Brasil o único de língua portuguesa a participar deste estudo e, abrange aproximadamente 85% da população mundial. Os dados mostram que quase 90% dos entrevistados, manifestam algum tipo de preconceito contra as mulheres.
A ONU analisou quatro indicadores: integridade física, educacional, política e econômica.
No que se refere a integridade física, no Brasil 75% dos (homens e mulheres) entrevistados, acreditam que existe uma justificativa para uma mulher ser agredida pelo seu companheiro.
Em relação a liderança e ao protagonismo político, 49% da população mundial respondeu que homens são melhores líderes políticos do que as mulheres.
Apesar dos progressos apresentados em alguns aspectos (como a educação, por exemplo), desde 1994 os índices globais de igualdade de gênero não apresentam avanços demonstrando um grande preconceito social em relação ao papel das mulheres na sociedade, na economia e no exercício da autonomia. Uma constatação é de que todos os desafios que enfrentamos para ocupar espaços (e quando os ocupamos) não estão ligados apenas às conjunturas; são desafios que são determinados pela estrutura da sociedade, profundamente desigual, moldado por e para homens.
O que chama a atenção ainda é a equalização dos entrevistados (mesmo percentual) em relação a homens e mulheres, destacando o quanto as mulheres compactuam com as práticas e opiniões machistas. Oprimidas pelo patriarcado e reproduzindo o discurso dos opressores, muitas mulheres que, como nós, sofrem violência e preconceito se colocam como forças auxiliares dos homens na reprodução do machismo, por vezes cometendo atos tão ou mais violentos com declarado na pesquisa. Para com esse machismo ainda não estamos preparadas para lidar.
A legislação e os direitos das mulheres avançam rumo a igualdade em relação aos homens, mas as atitudes e o pensamento social não, o que reflete um conservadorismo social no que tange aos papéis exercidos por mulheres agora quantificados pela ONU.
A violência de gênero em todos os seus desdobramentos (física, política, psicológica, patrimonial, moral) é legitimada e assim naturalizada pela sociedade, inclusive pelas próprias mulheres. Os métodos são atualizados todos os dias: da chibatada em praça pública, à cassação de mandatos eletivos, aos ataques de ódio nas redes sociais, às nomenclaturas depreciativas da nossa imagem e do nosso corpo, à referência ao nosso modo de vestir (loucas do chilique, destemperadas).
Como lidar com tudo isso?
Sem dúvida que a direção é quebrarmos nossas próprias barreiras, desafinar o coro dos contentes e enfrentarmos as violências, o que ainda não estamos acostumadas a fazer, e tratá-las como elas são: VIOLÊNCIAS. Pelo combate diário ao discurso de ódio, e pela informação. Não apenas ocupar espaços de poder e decisão, mas qualificar a ocupação desses espaços com o enfrentamento ao machismo seja ele de homens ou de mulheres, um exercício de educação e respeito cotidianos.
Por isso, mulheres, “mais amor de nós mesmas e uma das outras”. Somente assim é que conseguiremos enfrentar a estrutura machista, misógina e patriarcal, pela alteridade de umas com as outras.
(*) Mulher, Advogada, Pesquisadora, Mestre em Direito Público, Especialista em Ciências Penais, autora do livro Democracia Participativa e Planejamento Estatal: o exemplo do plano plurianual no município de Contagem. Secretária de Defesa Social de Contagem/MG, Sócia do França e Grossi Advogados.
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Coluna Mulher – 28.05 a 03.06.2023 – Nós, Mulheres. Primeiras palavras
Nós, Mulheres. Primeiras palavras
Por Viviane França(*)
Sexo frágil, esposa dedicada ao lar e aos filhos, recatada, submissa, improdutiva (no sentido laboral do termo)… Essas e muitas outras expressões deixaram de nos identificar, em certa medida. Temas que não eram quase falados tais como idade, mulheres negras, mulheres indígenas, mulheres na política, paulatinamente conquistam espaço, o que evidencia um cenário de avanços favoráveis à nossa causa.
Considero que rompemos com o silenciamento patriarcal que impõe que a mulher foi feita para o lar, para o trabalho doméstico. Quebramos as conveniências sociais que estavam postas, para avançarmos rumo ao governo de nós mesmas, desafiando inclusive as barreiras da participação política, revolucionando a nossa história. Desafinamos o coro dos contentes.
No entanto, à medida que avançamos como vozes transformadoras e revolucionárias, produzem e reinventam paradigmas de opressão. Ou seja, atualizam ou criam novas e sofisticadas formas de violência contra nós. Como não há opressão em resistência, resistir, para nós, é mais do que um verbo. É uma prática cotidiana. É o nosso jeito de ser e de estar no mundo. Por isso, resistimos com bravura, com ternura, com beleza, radicalizando na nossa identidade com nosso jeito, nossas vestes, gestos e palavras. Ocupando, sim, cada vez mais espaços e desempenhando protagonismos em lugares inimaginados por nossas bisavós. É a vida como ela é, ou como a fazemos: desafiadora. Mas sem sombra de dúvidas, é um caminho sem volta.
A Coluna da Mulher, neste contexto, surge como uma necessidade. Será, antes de tudo, um ponto de encontro de muitas vozes. É dirigida a todas as mulheres e, na medida em que tocará outras mulheres, produzirá o efeito “pedra no lago”, propagando para todas as pessoas. Não ser econômica nos temas e nem nas formas de dizer. Por aqui trataremos desde a história de mulheres e suas lutas, análises, problematizações, até os novos desafios que o século XXI nos impõe. Falaremos dos avanços sociais, políticos, intelectuais, jurídicos, mas também da beleza feminina, do autocuidado e do amor próprio. Do protagonismo da mulher, do empoderamento feminino como ferramenta de transformação e de superação do machismo. Será um exercício do poder de cura e de conquista do poder pela palavra (escrita e lida).
Por tudo isso é que a coluna da mulher será mais que um espaço. Eu preparo, mesmo, é um ato periódico e constante para libertar a nossa rebeldia onde todas as mulheres possam se reconhecer, se identificar; e fazer das nossas múltiplas potências um verdadeiro grito que ecoará por essa página de jornal.
A Coluna da Mulher é uma coluna para nós, Mulheres.
(*) Mulher, Advogada, Pesquisadora, Mestre em Direito Público, Especialista em Ciências Penais, autora do livro Democracia Participativa e Planejamento Estatal: o exemplo do plano plurianual no município de Contagem. Secretária de Defesa Social de Contagem/MG, Sócia do França e Grossi Advogados.